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quarta-feira, 19 de maio de 2010

A cor do barro e o hálito de Deus

Temos por certo muito de barro correndo em nossas veias. Somos pó. Um boneco modelado pelas mãos de Deus que, resolvendo brincar com argila do solo formou o ser humano e colocou em seu nariz o sopro da vida (cf. Gn 2,7a). Deu ao boneco de barro aquilo que tinha de mais íntimo, o seu hálito, sua sabedoria, seu amor. Assim fomos criados, do barro da terra e do sopro de Deus. Mas muitas vezes, somos mais pó, perdemos a alma divina, a ânima e acabamos desanimados, feridos, com medo e cheios de maldade.
Adquirimos o desejo de ferir quem está ao nosso lado mesmo sabendo que somos irmãos, que precisamos de ajuda para nascer, crescer e morrer. Deixamos de ser solidários e passamos a ser solitários, o que nos faz ainda piores pois perdemos a capacidade de nos preocupar com o outro, e com isso damos um salto profundo no abismo do sofrimento.
Não aprendemos a dar a outra face quando nos batem; não aprendemos a levar para hospedaria o desconhecido que está caído e ferido no caminho, perder tempo e dinheiro com ele; não aprendemos a perdoar setenta vezes sete e temos sempre uma pedra na mão prestes a ser lançada, não importando qual foi o pecado e muito menos quem é o pecador; corremos o risco de voltar a ser barro e nos transformamos novamente num ser inanimado, um boneco frágil e desanimado, isto é, sem o hálito de Deus.
Mas há sempre esperança e temos ainda o sopro dentro de nós, correndo pelas nossas veias, misturado ao nosso sangue, aos nossos sonhos, às nossas fraquezas. Temos o cristianismo que ajuda a humanidade a encontrar o seu caminho original, perdido ao longo dos séculos e dos desejos terrenos. Somos amados por Deus e disso não temos dúvidas, apesar de todo o sofrimento que passamos ou que causamos. Mas precisamos amar, acolher, ser ternos, pacientes. Precisamos fazer um encontro pessoal e intransferível com o Cristo. Só Ele pode nos garantir o equilíbrio entre o barro e o hálito, entre a carne e o espírito, entre a terra e céu.
Vivemos neste intenso conflito: queremos melhorar sempre, mas caímos sempre. Deparamo-nos nus diante do Criador e isso não deveria nos fazer mal, deveria sim nos fazer bem, mostrar quem somos, a cor do barro que modela nosso corpo, o cheiro do hálito que vem da boca do Criador, nossas fragilidades provindas do pó e nossas vontades inspiradas do Amor. Mas temos vergonha, somos pecadores demais. Voltamos a ser bonecos de argila do solo e cheios de medo falamos como Eva: “A serpente me seduziu e eu comi” (Gn 3,13b).
Somos o sonho de Deus, fomos transbordados em Seu coração, e, se ainda existimos é porque Ele não se cansou de nós, é paciente e misericordioso. Só precisamos acreditar no seu amor e dar uma chance para nós mesmos. Nós podemos melhorar, podemos consertar o que precisa de reparos, temos condições para isso. Só é preciso deixar Deus modelar novamente o que em nós está trincado, é preciso restaurar o coração e a alma. A humanidade precisa assumir sua cor frágil e deixar que o hálito de Deus a inspire nos cuidados deste mundo.
Quem sabe assim podemos assumir novamente a missão que nos foi confiada: “Iahweh Deus tomou o homem e o colocou no Jardim do Éden para o cultivar e o guardar”. (Gn 2,15)

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